392 – Quando o voluntariado deixa de ser um tapa-buraco

Há quem ainda insista em enxergar o voluntariado como um remendo, um improviso para suprir falhas de gestão ou carências crônicas de organizações sociais e/ou políticas públicas. É como se o voluntário fosse chamado apenas quando o barco já está fazendo água, para tapar buracos com as próprias mãos. Essa visão reducionista não apenas desvaloriza o potencial transformador do voluntariado, como também perpetua a ideia de que ele é acessório, secundário, quase descartável.

O voluntariado estratégico, ao contrário, nasce de uma compreensão madura: ele não é substituto de responsabilidades institucionais, mas sim força complementar que amplia impacto, gera inovação e fortalece vínculos comunitários. Empresas que o tratam como “programa de ESG ou RSE simpático” perdem a chance de integrá-lo às suas cadeias de valor, às suas estratégias de sustentabilidade e até mesmo à sua reputação. Organizações sociais que o veem como mão de obra barata deixam escapar o que há de mais precioso: o conhecimento, a criatividade e a energia cidadã que cada voluntário carrega.

Transformar o voluntariado em estratégia significa incorporá-lo ao planejamento, com objetivos claros, métricas de impacto e alinhamento às causas centrais da instituição. Significa reconhecer que voluntários não são apenas braços, mas cabeças e corações capazes de propor soluções, redesenhar processos e criar pontes entre mundos que raramente se encontram. É nesse ponto que o voluntariado deixa de ser paliativo e se torna motor de mudança.

Exemplos não faltam: programas de voluntariado corporativo que conectam profissionais a escolas públicas, levando competências de gestão e tecnologia; iniciativas comunitárias que, ao invés de apenas distribuir cestas básicas, criam hortas coletivas e redes de economia solidária; projetos culturais que não se limitam a organizar eventos, mas formam públicos, estimulam talentos e fortalecem identidades locais. Em todos esses casos, o voluntariado não tapa buracos — ele abre caminhos.

O desafio, portanto, é abandonar a mentalidade do improviso. Quem insiste em ver o voluntariado como remendo revela, no fundo, sua própria falta de visão estratégica. É mais fácil chamar voluntários para apagar incêndios do que para construir estruturas sólidas. Mas é justamente na construção que o voluntariado mostra sua potência: ele mobiliza, engaja, educa e transforma.

Se quisermos um país mais justo e resiliente, precisamos de voluntariado que não seja convocado apenas em emergências, mas que esteja presente no desenho das soluções. Voluntariado estratégico é investimento em cidadania, em inovação social e em futuro. Quem ainda o trata como tapa-buraco está preso ao passado ruim.

O voluntariado não é novo e sempre foi muito reconhecido, precisamos trazê-lo de volta a este lugar, inclusive com uma legislação mais protetiva e adequada as suas funções, bem como protetiva para as organizações que deles se utilizam de forma adequada. Estamos no momento para começar esta mudança de corretivo para estratégico.

Roberto Ravagnani é palestrante, jornalista (MTB 0084753/SP), radialista (DRT 22.201), Consultor especialista em voluntariado, ESG e responsabilidade social empresarial. Voluntário palhaço hospitalar, Conselheiro Diretor da Rede Filantropia, CEO da empresa de consultoria R. R. Desenvolvimento e Transformação Humana LTDA e do VOL, porta voz pela ONU, Associado da VRS Consult da Guatemala, prof. de Voluntariado da PADLA University- México e Único Brasileiro Consultor acreditado internacionalmente por Empresability . @roberto.ravagnani